Constantino I, também conhecido como Constantino o Grande, foi um dos imperadores mais influentes da história romana, governando o Império Romano entre 306, quando foi proclamado Augusto até 337 d.C., o ano de sua morte. Sua ascensão ao poder marcou uma série de mudanças significativas na política, religião e cultura do Império Romano.
Além disso, foi o primeiro Imperador publicamente convertido ao cristianismo, o que gerou um impacto duradouro nas crenças e práticas religiosas no mundo ocidental. Este artigo explora a vida e o legado de Constantino, destacando seu reinado, sua conversão ao cristianismo e como sua religião refletiu nas moedas cunhadas no decorrer dos anos.
Constantino nasceu em 272 d.C. na cidade de Naissus, na província da Mésia Superior (atualmente Niš, Sérvia). Ele assumiu o trono após a morte de seu pai, Constâncio Cloro (invocando o direito hereditário a sucessão), e sua ascensão foi marcada por conflitos internos e lutas pelo poder.
No entanto, ele conseguiu consolidar seu domínio e se tornou o único imperador em 324 d.C. Um dos aspectos mais notáveis do reinado de Constantino foi sua contribuição para a unificação do Império Romano. Ele transferiu a capital do império de Roma para Bizâncio, rebatizando-a como Constantinopla (atual Istambul, Turquia), o que facilitou a administração oriental do império. Além disso, ele empreendeu uma série de reformas administrativas, econômicas e militares que fortaleceram o governo central e estabilizaram a economia.
Uma das mudanças mais significativas associadas a Constantino foi sua conversão ao cristianismo. A tradição relata que, antes de uma batalha decisiva contra seu rival Maxêncio (também conhecido como Magêncio ou Maximiano II), Constantino teve uma visão de uma cruz no céu com a inscrição "In hoc signo vinces" ("Com este sinal, vencerás"). Ele acreditou que essa visão divina lhe garantia a vitória e, após ganhar a batalha da Ponte Mílvia em 312 d.C., ele começou a favorecer o cristianismo.
A conversão de Constantino o Grande ao cristianismo teve um impacto profundo e duradouro na história da Igreja Católica e na evolução do cristianismo como um todo. Sua decisão de adotar o cristianismo como a religião oficial do Império Romano trouxe uma série de mudanças que moldaram o curso da fé e influenciaram a sociedade e a cultura ocidental.
Antes da conversão de Constantino, os cristãos enfrentaram sérias perseguições por parte das autoridades romanas. A partir do Edito de Milão, emitido por Constantino em 313 d.C., a liberdade religiosa foi garantida aos cristãos e as perseguições diminuíram significativamente. Isso permitiu que a fé cristã crescesse e se espalhasse de maneira mais aberta e sem medo de repressões.
Constantino não apenas parou as perseguições, mas também começou a patrocinar a Igreja Católica. Ele doou terras e recursos financeiros para a construção de igrejas, mosteiros e outros locais de culto. Esse apoio material deu à Igreja uma base sólida para crescer e se desenvolver.
A conversão de Constantino levou à oficialização do cristianismo como uma religião aceita e respeitada dentro do Império Romano. Isso deu à Igreja Católica um status elevado e a oportunidade de influenciar diretamente a política, a cultura e a sociedade romana. Templos cristãos começaram a ser construídos, e o cristianismo passou a desempenhar um papel importante na vida cotidiana dos cidadãos.
Constantino convocou o Primeiro Concílio de Niceia em 325 d.C., que foi o primeiro grande concílio ecumênico da Igreja, sendo este um marco fundamental na definição da doutrina cristã e na resposta a desafios teológicos da época, como a controvérsia ariana (disputa teológica no cristianismo primitivo que questionava a natureza de Jesus Cristo em relação à divindade e sua relação com Deus Pai). Esse concílio estabeleceu os fundamentos do credo niceno, que ainda hoje é uma declaração central de fé na Igreja Católica.
Além disso, sua conversão inaugurou uma relação simbiótica entre a Igreja e o Estado, que teve implicações significativas na política e na sociedade. A Igreja passou a desempenhar um papel político mais ativo, influenciando as decisões imperiais e desempenhando um papel crucial na administração do império.
A oficialização do cristianismo e o apoio do imperador ajudaram a Igreja Católica a expandir-se para novas regiões e a ganhar poder e influência em todo o Império Romano. Isso também preparou o terreno para a Igreja Católica se tornar uma instituição global que influenciou a história e a cultura mundial.
A religião de Constantino teve um impacto visível em suas moedas romanas. Após sua conversão, ele começou a retratar símbolos cristãos em suas moedas, como a cruz cristã e o monograma de Cristo, o Chi-Rho, que combina as primeiras duas letras do nome grego de Cristo. Contudo, há uma dúvida se esses símbolos realmente teriam alguma relação cristã direta. Historicamente, o Chi-Rho apareceu pela primeira vez no século III a.C. em um bronze grego de Ptolomeu. Acreditamos que a explicação mais lógica é que, em um primeiro momento, os mestres gravadores responsáveis pela definição de como seria a moeda efetivamente cunhada tiveram a partir da conversão de Constantino uma certa liberdade para utilizar como marca de cunhagem o monograma de Cristo, não sendo uma solicitação direta do imperador, uma vez que esta marca não será encontrada em todas as moedas seguintes a sua conversão.
Para os pesquisadores da área, o exemplar acima é o primeiro cunhado por Constantino, o Grande, que possuía uma clara menção (ou intenção) cristã, afinal, a serpente (ou cobra) é utilizada como retratação do inimigo já na história do Jardim do Éden e a expulsão de Adão e Eva do paraíso, sendo cunhada catorze anos após sua conversão. Segundo Eusébio, por mais que Constantino I havia efetivamente se convertido ao cristianismo e o declarado como religião oficial do Império, o mesmo teria sido muito cauteloso nesse sentido de publicidade, se mantendo zeloso principalmente em questões que envolvessem o exército e o Senado, deixando assim suas moedas “cristãs”, um claro instrumento de fala com o povo, para um período que foi julgado por ele como o ideal para esse tipo de diálogo.
Por fim, por mais que não tenha sido cunhada durante o seu governo (ou mesmo em seu período de vida), não podemos esquecer do exemplar “Divo Constantino”, onde Constantino I já é retratado com a cabeça velada e ainda, no reverso, é guiado pela mão de Deus ao conduzir uma quadriga (uma clara alusão a lenda de sua conversão), exemplar que veremos a seguir:
Ainda assim, as pessoas que esperam encontrar imagens cristãs nas moedas de bronze de Constantino I ficarão desapontadas. “De aproximadamente 1.363 moedas de Constantino I no RIC VII, cobrindo o período de 313-337, aproximadamente um por cento pode ser classificado como tendo símbolos cristãos - Dunning 2003.” A primeira ocorrência de um chi-rho em uma “moeda” de Constantino está, na verdade, em um raro medalhão de prata emitido em Ticinum em 315 d.C. que veremos a seguir:
Trata-se de uma peça da mais alta raridade (exemplar da imagem acima vendido no ano de 2018 por 250 mil francos suíços, o que se fosse convertido para o dia de hoje teríamos algo perto dos R$1.420.000,00), estima-se que existam somente 4 exemplares ao todo, sendo este da foto o melhor exemplar conhecido.
Este incrível medalhão foi distribuído como doação militar como parte das comemorações dos decênios de Constantino (10º aniversário de seu reinado) em 315 d.C. Constantino tal como acontece com muitas edições especiais associadas com a decennalia, o usual retrato imperial de perfil foi evitado em favor de um cativante retrato frontal que parece olhar fixamente para o observador. O capacete ornamentado e com crista extravagante apresenta o Chi-Rho - um monograma formado pelas duas primeiras letras gregas do nome "Cristo".
Eusébio, em sua pesquisa, acrescenta ainda que, mais tarde na vida, Constantino passou a usar um capacete com o monograma Chi-Rho estampado nele porque achava que esse monograma lhe dava proteção divina adicional na batalha. O elmo representado aqui certamente deve ser o mesmo descrito por Eusébio. Seus poderes apotropaicos foram aumentados ainda mais após 326-328 d.C. com a adição de uma coroa feita de um prego que se acredita ser da Verdadeira Cruz.
A pose de Constantino, segurando um escudo com o brasão da loba amamentando Rômulo e Remo e com a mão direita conduzindo um cavalo pelo freio, o apresenta como o mestre de Roma, o que foi uma característica significativa das celebrações da decennalia. Parte das festividades incluiu a dedicação do Arco de Constantino em Roma para comemorar sua vitória sobre Maxêncio três anos antes. Como o Chi-Rho no capacete, as celebrações também colocam em exibição pública as inclinações cristãs de Constantino. Embora se esperasse que ele dedicasse o arco com sacrifícios aos deuses romanos tradicionais, ele se recusou a fazê-lo por respeito ao Deus cristão cuja intervenção lhe rendeu a cidade. O retrato com cavalo e escudo neste medalhão também serve para anunciar Constantino como o legítimo e incontestado Augusto no Ocidente.
A construção artística do reverso pode representar a ocasião em que o medalhão foi entregue, pois Constantino aparece de pé sobre um estrado com a Vitória cercada por quatro soldados de infantaria e quatro cavaleiros. Que melhor maneira de preservar a SALVS REIPVBLICAE ("saúde do estado") mencionada na lenda do que a distribuição de medalhões valiosos, atraentes e simbolicamente significativos aos comandantes do exército?
Constantino o Grande desempenhou um papel transformador na história romana, tanto através de seu reinado político quanto de sua conversão ao cristianismo. Sua decisão de adotar o cristianismo como a religião do Estado teve um impacto duradouro no desenvolvimento da fé e influenciou a cultura ocidental. As moedas romanas emitidas durante seu reinado refletiam sua nova religião e valores, testemunhando a fusão entre o antigo mundo pagão e a emergente fé cristã. Para entender um pouco mais da relação entre religião e numismática, convido todos a lerem o meu livro “Numismática Bíblica: As moedas clássicas e suas relações teológicas, históricas e numismáticas”.
Para citar esse texto:
PADILHA, André Luiz de Castro. As moedas cristianizadas de Constantino, o Grande. Movimento Numismático, Rio de Janeiro - Manaus, Anno.1 - Edição 01, p.39-46, 2023.
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